No dia 20 de agosto, a Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) convidou dezenas de especialistas para abordar o tema “Cenário Atual da Resistência Bacteriana”, em São Paulo.
O Dr. Fábio Brazão, presidente da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) abriu o evento agradecendo a todos os participantes e a apoiadora Cepheid. Depois, passou a palavra para a Dra. Antônia Maria de Oliveira Machado, coordenadora do comitê de microbiologia da entidade.
Muito emocionada, elogiou o Dr. Fábio por seu crescimento profissional ao longo dos anos, desejando que ele faça uma gestão de muito sucesso. Ao longo da trajetória do médico, ela teve a oportunidade de acompanhá-lo até chegar à presidência da sociedade.
Dra. Antônia, deu um panorama geral de como começaram os eventos sobre microbiologia nos anos 2008/2009. Ela relembrou a oportunidade que teve de estar com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Organização Panamericana de Saúde junto com os LACENs e a rede microbiana.
Essa participação se compôs de cursos online, manual de boas práticas de microbiologia, nos quais os alunos estudavam, tiravam dúvidas com os tutores disponíveis da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e depois faziam as aulas práticas presenciais. “Ficamos muito orgulhosos de pensar que isso foi uma semente para os grandes programas do País”, conta a médica.
Quando se fala de controle de resistência no Brasil, ressaltam-se dois programas: o BrCAST (Comitê Brasileiro de Testes de Sensibilidade Antimicrobianos) e o BrGlass. O papel deles é treinar, atualizar e facilitar para os laboratórios de microbiologia, porque todos os documentos estão disponíveis gratuitamente, além de cursos que podem participar frequentemente.
O BrGlass é o Plano Nacional de Monitoramento de Vigilância de Resistência, projeto que partiu do Ministério da Saúde (MS). O piloto foi no LACEN do Paraná. Cinco laboratórios estão participando há algum tempo e monitoram casos de resistência, além de depositar os dados no Glass, que é um programa de monitoramento mundial. O projeto também tem parceria com a Fiocruz, Unifesp e mais 10 hospitais que serão incluídos no projeto.
Há um crescimento global que tanto para a saúde como para a economia mundial tem um impacto forte. Pela possibilidade de trânsito de animais, comidas, de pessoas, a facilidade de disseminação rápida ultrapassa fronteiras. Projeta-se que para 2050, 10 milhões de pessoas morrerão por ano.
Durante a palestra Cenário Atual da Resistência Bacteriana no Contexto da Pandemia no Brasil por covid-19, a Dra. Ana Cristina Gales, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) falou que, no início da pandemia, se prescrevia bastante a Azitromicina, o que pode ter contribuído para o aumento da resistência bacteriana. Ressaltou que, inicialmente, estudos demonstraram tendência na redução da resistência aos antimicrobianos devido ao uso de máscara (redução de outras infecções respiratórias) e restrição do trânsito de pessoas no mundo.
Entretanto, segundo a médica, outros fatores podem regular positivamente o surgimento de resistência, como por exemplo, aumento do uso de antissépticos. Isso pode levar ao surgimento de resistência em bactérias pela expressão de bombas de fluxo.
Em hospitais públicos, houve cancelamento de cirurgias eletivas, fazendo com que menos pacientes fossem aos hospitais. Porém, muitos progrediam com complicações mais graves aos serviços de saúde.
O Dr. Marcelo de Oliveira Maia, presidente da SBI, falou, sobre o tema “Impacto da Resistência bacteriana nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI)”, dos micro-organismos multirresistentes mais prevalentes nas UTIs, e disse que a cobertura antimicrobiana é essencial no tratamento sendo que, o atraso da antibioterapia está relacionada ao aumento significativo a mortalidade.
No Brasil observou aumento significativo de infecções por bactérias Pseudomonas e Acinetobacter multirresistnetes, dentro das unidades de terapia intensiva.
O Dr. Marcelo Pilonetto, consultor externo do Ministério da Saúde para o Programa de Monitoramento de Resistência Antimicrobiana – BR GLASS, falou sobre o BrCAST, no Contexto do Combate à Resistência Antimicrobiana no País. Em 2011, foi assinado um Termo de Compromisso entre a Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC) Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Sociedade Brasileira de Microbiologia e Sociedade Brasileira Patologia Clínica/Medcina Laboratorial (SBPC/ML) para criação de um Comitê Brasileiro de padronização de teste de sensibilidade aos antimicrobianos no País.
Posteriormente, essa iniciativa deu origem ao BrCAST, que faz parte do Comitê Europeu de Testes de Sensibilidade (EUCAST) e, em seguida, foi chancelada pelo Ministério da Saúde como a padronização oficial brasileira para todos os laboratórios públicos e privados, por meio da Portaria nº 64 do Ministério da Saúde de 11 de dezembro de 2108 (https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/55217765/do1-2018-12-14-portaria-n-64-de-11-de-dezembro-de-2018-55217696).
“Diversas iniciativas têm sido realizadas pelo BrCAST, como encontros, cursos em Congressos nacionais e oficinas junto ao Ministério da Saúde de ANVISA”, comenta o Dr. Marcelo. O médico falou também sobre o projeto liderado por ele, a iniciativa do BrGlass, junto ao MS, Organização Panamericana de Saúde e Organização Mundial da Saúde (OMS).
Detecção Mecanismos de Resistência mais Impactantes em Gram positivos foi um assunto tratado pelo Dr. Pedro Fernandez Del Peloso, gerente de microbiologia molecular da Rede D’Or São Luiz. Ele ressaltou o desafio na detecção de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) e sobre as dificuldades técnicas para determinação da concentração inibitória mínima (CIM) à vancomicina pelos laboratórios (deve ser realizada preferencialmente a técnica de microdiluição em caso de acordo com as recomendações da ISP 20776).
O Dr. Jorge Luiz Mello Sampaio, membro do EUCAST, abordou o tema Detecção dos Mecanismos de Resistência mais Impactantes em Bacilos Gram negativos destacando a importância e os desafios na detecção desses mecanismos na rotina microbiológica.
“A detecção tem finalidade epidemiológica ou pode ter um ajuste terapêutico, enquanto o antibiograma não está disponível. As mais frequentes no Brasil são as carbapenemases em Enterobacterales e o antimicrobiano mais ativo contra os isolados produtores de KPC é a ceftazidima-avibactan”. Comenta o Dr. Jorge.
Em resumo, o especialista conclui que nenhum método é 100% sensível e específico e, além disso, há diferença na incorporação de testes de alto custo à rotina de microbiologia.
Cultura de Vigilância Convencional vs. Molecular no rastreio de patógenos multi-R – Visão do Laboratório foi um assunto tratado pela Dra. Ana Paula Cury, membro do Comitê de Microbiologia da SBPC/ML. De acordo com a especialista, a cultura de vigilância clínica é importante para rápida identificação de pacientes portadores de bactérias multirresistentes e, assim, permitir adoção de medidas de controle para evitar a disseminação de resistência a outros pacientes no ambiente hospitalar.
“Esse paciente pode ser portador silencioso de bactérias multirresistentes. Ele pode transmitir bactérias e genes de resistência para outros pacientes que não têm esses patógenos”, diz Ana Paula.
O objetivo é identificar esses pacientes e permitir que medidas de disseminação de contato sejam tomadas. “O médico pode entrar com uma terapia empírica. As taxas de infecção por Acinetobacter multirresistente, segundo o Centro de Vigilância Epidemiológica de São Paulo, em 2020, nas UTIs adultos, chegaram a 83%”, conta a doutora.
Uma das técnicas de vigilância molecular no Brasil é o PCR em tempo real, feito diretamente com um cotonete estéril (swab), onde se tem uma resposta no mesmo dia. Isso é um ganho absurdo no gerenciamento de leito, pois pode-se colocar ou tirar o paciente de isolamento no mesmo dia.
O Dr. Diogo BondimFerreira, membro da SBI, apresentou uma questão importante: Visão da SCIH: Vale o Mecanismo ou a Resistência? Segundo o infectologista, as medidas de controle da disseminação de Multirresistência tiveram grande detecção do gene KPC. Além disso, em agosto deste ano, houve aumento de quase 400% de bactérias produtoras de carbapenemases.
“Diversos estudos demonstram o impacto da covid-19 no uso de antimicrobianos e a piora na microrressistência nesses serviços”, comenta o Dr. Diogo.
Ele completa “as falhas para as bactérias Gram têm impacto na mortalidade, além disso, dentro dessa interface, é importante atentar-se aos indicadores do gerenciamento do uso de antimicrobianos, visando o uso adequado e otimizado desses medicamentos”.
Rastreio molecular de patógenos mulit-R: Experiência na implementação foi o tema discorrido pelo Dr. Marco Malschitzky, consultor dos hospitais bom Jesus de Ituporanga e Regional Alto Vale, ambos de Santa Catarina. Ele relatou a experiência na implementação do teste molecular para rastreamento de resistência em seu serviço. Propôs um método que reduz de 72h para 4h o resultado do exame, porém, a um custo elevado. Entretanto, após explicar e comprovar todas as vantagens que um exame mais rápido levaria, incluindo redução de custos e melhor experiência ao paciente, houve aprovação da diretoria do hospital.
Ainda sobre o mesmo tema, a Dra. Giselle Dall Cortivo, coordenadora do laboratório da Empresa Unimed Litoral, de Santa Catarina, relatou a experiência no serviço onde trabalha onde implementou o rastreamento de patógenos multirresistentes por métodos moleculares e detecção de microrganismos de preocupação hospitalar.
A construção do projeto foi feita com base nos principais desafios, um deles por serem hospitais de pequeno porte com a maior gestão no giro de leitos. Exames que usualmente eram liberados em 48h a 72h passaram liberados no dia, resultando em benefícios para o paciente e para a Instituição.
“O período de avaliação foi de 14 meses, foram observados 651 pacientes, 458 resultados negativos e houve uma economia de R$ 2.021.348,80”, comenta a Dra. Giselle.
Com informações do CBDL (29/08/2022)